Eu comecei a trabalhar com finanças pessoais em meados dos anos 90 e fico feliz em ver como o tema ganhou importância no Brasil nas últimas três décadas.

Em 2001, fui fazer parte do meu doutorado no Canadá e ainda lembro como fiquei impressionado quando vi na livraria uma estante inteira dedicada à literatura de finanças pessoais, quase tão grande quanto a estante de Economia. Naquela época, no Brasil, salvo melhor juízo, só tínhamos o livro “Seu Futuro Financeiro”, do meu querido amigo Louis Frankenberg.

Foi natural meu deslumbramento e, no primeiro dia, saí da livraria com oito livros, entre eles “O Milionário Mora ao Lado”, de Thomas J. Stanley e William Danko. Stanley, doutor em administração de empresas pela Universidade da Geórgia, e Danko, professor emérito da School of Business da State University de Nova York em Albany, nos Estados Unidos.

Este livro, em especial, me causou um enorme impacto e mudou a forma como passei a encarar as finanças pessoais.

No livro, os autores descobriram que muitos dos milionários americanos viviam em bairros de classe média e eram pessoas comuns, como médicos, professores, empresários e gerentes de negócios. Eles haviam acumulado riqueza ao longo do tempo, economizando dinheiro, investindo em imóveis e/ou em negócios, mas principalmente vivendo um pouco abaixo de suas possibilidades.

Uma das principais conclusões do livro “O Milionário Mora ao Lado” foi que a riqueza não é determinada pela renda, mas sim pela poupança. Outra descoberta interessante do livro foi que muitos dos milionários americanos não gastavam dinheiro em bens de luxo para mostrar sua riqueza. Eles preferiam viver em casas modestas, dirigir carros usados e vestir roupas simples. Eles geralmente não valorizavam as aparências, não queriam parecer ricos, mas sim ser ricos de fato.

Esses autores me mostraram que há uma grande diferença entre aparentar ser rico e ser rico de verdade. Stanley criou o conceito de acumulação de riqueza versus renda, dividindo seus entrevistados em subacumuladores de riqueza (SARs) e acumuladores prodigiosos de riqueza (PARs), comparando o quanto cada pessoa é capaz de poupar em relação ao que ganha.

Thomas Stanley tem uma regra para estimar o patrimônio líquido esperado que é:

Patrimônio líquido esperado = idade x renda anual x 0,1

Então, vamos tomar como exemplo uma pessoa de 50 anos e com uma renda anual de R$260 mil.

Patrimônio líquido esperado = 50 x R$260.000,00 x 0,1

Portanto, a tal pessoa deveria ter acumulado R$1,3 milhões. Assim, se ela acumulou mais é um PAR, se acumulou menos é um SAR.

Stanley e Danko descobriram em sua pesquisa que em algumas profissões, as pessoas são pressionadas a manter determinados padrões de consumo extremamente dispendiosos, o que afeta negativamente a acumulação de riqueza. Profissionais como médicos, arquitetos, dentistas, analistas financeiros, executivos de grandes empresas e juízes, por exemplo, são esperados que gastem grandes quantias de dinheiro em roupas, casas, carros e que frequentem locais igualmente caros. Como resultado, o estilo de vida consome uma grande parte da renda, deixando pouco dinheiro para aumentar o patrimônio.

Por outro lado, em profissões com menor status social, é mais fácil escolher um estilo de vida mais espartano, o que facilita a conquista de ótimos patrimônios e permite uma velhice financeiramente confortável. Donos de pequenos negócios, contadores, engenheiros, programadores e executivos de pequenas empresas são exemplos desse tipo de profissão.

No livro, “O Milionário Mora ao Lado”, Stanley e Danko apresentaram uma série de características comuns entre os milionários americanos estudados, que são muito semelhantes às que observo entre pessoas financeiramente bem-sucedidas no Brasil:

  1. Vivem abaixo de suas possibilidades. Ao contrário do senso comum, a maioria dos milionários evita ostentar riqueza e prefere viver uma vida mais simples e frugal, em vez de comprar carros de luxo e mansões extravagantes.
  2. Investem em ativos em vez de passivos. Essa característica foi bastante explorada por Kiyosaki e Lechter no livro “Pai Rico, Pai Pobre”. Os milionários sabem que a chave para a riqueza está em investir em ativos que gerem renda passiva, como imóveis, títulos de dívidas e ações, em vez de gastar dinheiro em passivos que geram apenas despesas, como carros de luxo, mansões extravagantes e símbolos exteriores de riqueza.
  3. Focam na construção de patrimônio. Os milionários têm uma visão de longo prazo e estão sempre buscando formas de construir e aumentar seu patrimônio. Eles não se contentam em simplesmente ganhar dinheiro, mas sim em acumular riqueza ao longo do tempo.
  4. Trabalham duro e investem bem o dinheiro ganho. Os milionários são pessoas que trabalham de forma intensa e geralmente amam o que fazem. Eles sabem que a chave para o sucesso financeiro está em não apenas ganhar dinheiro, mas também em saber como investi-lo e multiplicá-lo.
  5. Valorizam a educação e o conhecimento. Os milionários sabem que o aprendizado constante é fundamental para o sucesso em qualquer área, incluindo finanças pessoais.

Pelas razões expostas, tenha muito cuidado. Existe uma enorme diferença entre parecer rico e ser rico. Eu aprendi a julgar a riqueza das pessoas pela resposta à pergunta “quanto tempo mais?”. Em outras palavras, se a pessoa parar de trabalhar hoje, por quanto tempo poderia se sustentar com o próprio patrimônio e com eventuais rendas como pensões públicas, planos de previdência privada ou outras rendas garantidas?

Quando você puder sustentar seu padrão de vida almejado por alguns anos, além da sua expectativa de vida e sem depender da renda mensal do seu trabalho, você poderá ser considerado rico.

Um ponto muito importante a ser considerado é a análise da tábua biométrica. Essa ferramenta estima a probabilidade de um indivíduo morrer em uma determinada idade e quantos anos ele tem, em média, de expectativa de vida. Ao analisar a tábua biométrica BR-EMS – versão 2021, descubro que minha expectativa de vida vai até os 84,3 anos. No entanto, é necessário analisar com atenção esse número.

Por exemplo, no meu caso, como nasci em 1961, tenho uma expectativa de vida de 23,3 anos. Isso significa que metade das pessoas da minha idade vai morrer antes dos 84,3 anos, e a outra metade viverá além dessa idade. Por isso, é importante ter uma boa margem de segurança antes de pensar em se aposentar.

Por fim, é crucial ter precaução com o estilo de vida que se leva, pois ele pode acarretar graves problemas no futuro. É importante lembrar que uma vida rica não significa necessariamente uma vida cara.

E agora, falando sobre você, você é rico ou apenas aparenta ser rico?

Author

É doutor em Finanças Comportamentais, com pós-doutorado em Psicologia Cognitiva pela Université Libre de Bruxelles (ULB) e professor de Finanças Pessoais da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

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