Na vida existe o momento de plantar e o momento de colher. Quando somos jovens, devemos ter a capacidade de poupar e investir para o futuro. Quando os cabelos prateados começam a aparecer, é hora de pensar na colheita.

Com a euforia do fim da Segunda Guerra Mundial, houve um súbito aumento de natalidade e uma drástica queda da mortalidade infantil. Esse grande número de crianças deu nome à geração que nasceu entre 1946 e 1964, os baby boomers, ou explosão de bebês. Pois bem, agora os últimos boomers estão entrando na terceira idade, mas para muitos isso não necessariamente está sendo sinônimo de colheita.

Quando nascemos, a expectativa de vida das pessoas de nossa geração passava pouco dos 50 anos. Os avanços nas condições sanitárias, na alimentação e na medicina possibilitaram que essa expectativa aumentasse em 30 anos. Mais do que ganhar três ou quatro décadas, o que nós, boomers, ganhamos foi mais tempo com qualidade de vida. O que aumentou não foi o tempo de velhice, nós conseguimos postergar a entrada nela, ganhamos mais tempo de vida adulta. Nossa geração se transformou no que vem sendo chamado de tsunami prateado, ou tsunami 60+.

Pessoas com dinheiro, boa capacidade intelectual que nos permite continuar produtivos, boa saúde e relações sociais intensas são a parte meio cheia do copo. Infelizmente existe a parte meio vazia: pessoas que não conseguiram formar um bom pecúlio para sua aposentadoria e que hoje já não conseguem gerar renda suficiente para manter o padrão de vida de outrora.

Mesmo entre os boomers que chegaram à juventude prateada com boa condição financeira, existem muitos que não estão conseguindo aproveitar seu momento de colheita, pois agora estão tendo que sustentar filhos e netos.

Muitos membros da geração prateada estão sustentando mais de 12 milhões de jovens do chamado grupo dos “nem-nem”, um grupo de pessoas que nem estuda nem trabalha, em sua maioria da geração Z. Segundo a consultoria IDados, até o segundo trimestre de 2021, 30% dos adultos até 29 anos não tinham trabalho fixo nem estudavam. Isso significa mais de 12 milhões de pessoas que vivem na dependência dos seus progenitores.

Entretanto não são apenas os “nem-nem” que têm demandado ajuda financeira dos mais velhos. Mesmo entre os adultos na casa dos 30 anos, esses da geração Y, há muitos que já constituíram família e estão trabalhando, mas ainda dependem da ajuda financeira dos pais para fechar as contas do mês.

Não para de aumentar o número de pessoas da chamada terceira idade que precisa sustentar seus dependentes e até mesmo pagar pensão alimentícia por vias judiciais na chamada pensão avoenga. Segundo algumas correntes jurídicas, na impossibilidade de os pais sustentarem os filhos, a obrigação recai sobre os avós, que podem até mesmo ser levados à prisão caso não cumpram com o pagamento da pensão.

Como em tudo que acontece no seio das famílias, as situações de pais sustentando filhos e netos é bastante diversa.

Em muitas famílias, essa relação é consensual, os genitores aceitam de bom grado a convivência sob o mesmo teto ou a relação de dependência econômica. Geralmente são situações em que existe uma relação de ganha-ganha, e uma eventual ajuda material é contrabalançada pelo retorno afetivo ou de colaboração nas atividades da casa, reduzindo a carga daquele que acolhe os dependentes mesmo após cessada a obrigação legal do sustento ou abrigo.

Em outros casos, essa relação é cercada de conflitos. Muitas vezes a recusa ou a impossibilidade dos filhos adultos em arcar com as obrigações da maturidade gera imensos transtornos para a merecida fruição do padrão de vida que foi duramente batalhado pelos pais ao longo dos anos.

Por conta da minha atividade como planejador financeiro, tenho conversado com muitas famílias que estão passando por grandes dramas com a situação de sua prole. Recentemente acompanhei uma bem-sucedida dentista com 60 anos que tem uma filha com 40 anos que nunca trabalhou. A filha, logo depois de engravidar, levou o pai da criança para morar na casa da mãe. A relação do casal nunca foi boa e atualmente está rompida, porém o genro se nega a sair da casa da sogra pois não aceita a separação.

A dentista é uma mulher que goza de ótima saúde, pratica exercícios físicos regularmente, tem uma boa turma de amigos e dispõe de condição financeira que lhe permitiria viver uma esplêndida adolescência platinada, porém hoje precisa sustentar uma filha, um ex-genro e um neto, além de conviver com eles e seus conflitos. Mãe e filha têm profundas divergências na forma como a criança é educada. Para piorar, como o casal vive em constante conflito, há uma competição dos dois para mimar de todas as formas o rebento, o que desagrada profundamente a avó.

A dentista tem outro filho, que é um bem-sucedido médico. A relação entre os dois sempre foi boa, mas agora vem se deteriorando de forma profunda, já que ele não aceita a situação absurda que a mãe está vivendo. Ela não consegue romper o círculo vicioso que se estabeleceu, pois a filha sempre a culpa pelos problemas que vive, utilizando-se de chantagem emocional para manter a situação de dependência.

Esse é apenas um caso dramático e emblemático entre tantos outros que algumas famílias vêm enfrentando.

Grande parte da geração dos boomers foi criada em famílias numerosas, em que havia pouca liberdade e muitas obrigações. Nessa época, normalmente tratávamos pai e mãe por senhor e senhora. Eram casas em que se sabia claramente quem mandava e quem devia obedecer – e quem não quisesse se adequar às rígidas regras sabia de antemão que a porta da rua era o caminho para os descontentes.

Esses boomers em geral tiveram poucos filhos, que foram criados com enormes facilidades e liberdades. Como diz um ditado árabe: tempos difíceis fazem os fortes e tempos fáceis fazem os fracos.

Muitas pessoas da geração prateada que está na merecida fase de colheita, infelizmente, agora colhem o amargo fruto de ter que sustentar filhos que não foram preparados para a vida. São jovens que viveram cercados de facilidades e não têm forças para encarar as agruras nem colher os louros de uma vida adulta autônoma.

Não existe solução fácil para resolver o choque das gerações. Importante ressaltar que a geração Z é muito mais heterogênea do que a geração dos baby boomers, assim, existem muitos jovens adultos que vêm trilhando carreiras de sucesso e hoje representam grande orgulho para os seus pais, mães, avôs e avós.

Os genitores tendem a enfraquecer os filhos fracos e fortalecer os filhos fortes. Se você está longe de ter cabelos prateados e ainda está criando seus filhos, se dedique arduamente para fortalecê-los. Como um pai grisalho, sei que é muito mais fácil mimar do que educar. Felizmente, tenho muito orgulho dos zoomers que eduquei junto com a Celina.

Author

É doutor em Finanças Comportamentais, com pós-doutorado em Psicologia Cognitiva pela Université Libre de Bruxelles (ULB) e professor de Finanças Pessoais da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

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