Acabamos de chegar a 8 milhões de habitantes na Terra, segundo estimativa da ONU.
Desde o surgimento do Homo sapiens, levou cerca de 300 mil anos até que um bilhão de seres humanos povoassem a Terra, por volta de 1800. Naquele ano, segundo a organização Our World in Data, a expetativa de vida ao nascer era de apenas 29 anos.
Atualmente, a expectativa média de vida dos humanos é de 71 anos. Porém, na maior parte dos países desenvolvidos passa dos 80 anos. No Brasil estamos no meio do caminho, atualmente a nossa expetativa de vida ao nascer é de 76,8 anos.
Todavia, quando tratamos de média precisamos pensar que nela cabem muitas diferenças. No Brasil a expectativa de vida dos homens é de 73,3 anos. Já, a expectativa de vida das mulheres é de 80,3 anos. Também, se compararmos a expetativa de vida do Sul do país com a do Nordeste encontraremos enormes diferenças. Da mesma forma, se compararmos a expetativa de vida das pessoas que nasceram em Heliópolis com aquelas que nasceram no Morumbi, bairro vizinho, encontraremos diferenças significativas.
Quando eu nasci, em 1961, a minha expectativa de vida era de 54,6 anos. Hoje quando olho para a tábua de mortalidade, divulgada pelo IBGE em 2020, ainda tenho mais 20,1 anos de expetativa de vida. Portanto, tive um ganho de mais de 25 anos de vida.
Quando falamos em aumento da população devemos lembrar que a redução da mortalidade infantil teve um papel extremamente relevantes. No início do século 19, na Suécia 38% das crianças morriam antes de completar 5 anos de vida. Atualmente, na mesma Suécia apenas 0,3% das crianças morrem antes dos 5 anos. Em 1950, no Brasil, 20% das crianças morriam antes de completar 5 anos. Atualmente, o número de crianças que morrem antes dos 5 anos diminuiu para 1,6%. Um número ainda elevado se compararmos com a Suécia, mas muito menor do que há 7 décadas atrás.
O extraordinário livro “Longevidade – uma breve história de como e por que vivemos mais”, do escritor norte americano Steven Johnson, descreve a façanha de termos conseguido aumentar drasticamente o número de habitantes na Terra. Também, ele busca explicações para justificar o fato de termos mais do que dobrado nossa expetativa de vida e, não menos importante, indica fatores que afetaram a diminuição da mortalidade infantil. Tudo isto conquistado em pouco mais de dois séculos!
O autor classifica as inovações em três grandes grupos: aquelas que salvaram milhões; centenas de milhões e bilhões de vidas humanas.
Coquetel para a aids, anestesia, angioplastia, medicamentos contra a malária, reanimação cardiopulmonar, insulina, hemodiálise, terapia de hidratação oral, marca-passos, radiologia, refrigeração e cintos de segurança salvaram milhões de vidas.
Antibióticos, agulhas bifurcadas, transfusão de sangue, cloração da água e pasteurização do leite salvaram centenas de milhões.
Já, na casa dos bilhões de vidas salvas estão os fertilizantes, tratamento sanitário dos esgotos e vacinas.
Cada um destes avanços é descrito com detalhes, muitas vezes derrubando o mito de que ideias e criações importantes vem de algum gênio solitário. Ao contrário disso, conceitos e inventos importantes vêm de uma rede de cooperação. Mas, a parte mais instigante do livro ficou para a conclusão, quando o autor discute as pesquisas feitas por Howard Chang, Shinya Yamanaka, Aubrey de Gray entre outros. Estes pesquisadores estão abrindo as portas para um novo salto na expetativa de vida e, talvez, até para podermos no futuro experimentar a imortalidade.
O aumento da expetativa de vida e a redução drástica da mortalidade infantil é um fenômeno fantástico para os indivíduos. Porém, cada vez mais, parece que estamos atingindo o limite do planeta Terra para sustentar tantas pessoas. Então, precisamos refletir se todas estas conquistas são boas para a espécie humana.
As projeções dão conta de que muito em breve atingiremos o pico de 10 bilhões de pessoas no planeta Terra e esse será o momento em que a população deverá começar a diminuir. Aliás, isto já vem ocorrendo em grande parte do mundo. Apenas a Índia e países do continente africano continuam em franco crescimento.
Mas, o fato de a população parar de crescer não quer dizer que atingiremos o equilíbrio entre a capacidade do planeta e as demandas da população. É factual que, se todos os humanos passassem a consumir como os habitantes dos países ricos, a Terra entraria em colapso.
Porém, devemos lembrar da teoria de Thomas Malthus, no início do século 19, que predizia um cenário trágico para a humanidade, caso o crescimento populacional continuasse a uma taxa constante. Ele dizia que, enquanto os meios de subsistências crescem em progressão aritmética, a população cresce em progressão geométrica, e a melhoria da humanidade seria impossível sem limites rígidos para a reprodução.
Pois bem, a população saiu de um bilhão para 8 bilhões e, felizmente, ainda hoje conseguimos alimentar toda esta população com folga. Evidentemente, convivemos de forma vergonhosa com a fome no mundo, porém, ela não decorre da falta de produção. Mas, sim, de erros políticos e de desigualdades injustificáveis.
Talvez, a inventividade humana descubra formas de reduzirmos a queima de combustíveis fósseis e possamos sustentar uma população de 10 bilhões de habitantes com qualidade.
Talvez, possamos atingir a imortalidade, como sugerem Chang, Yamanaka e Gray. Porém, é pouco provável que ela seja disponível para todos e, mais do que isto, será que ela seria desejável?
Dobramos a expectativa de vida. Para isto, foi preciso mudar radicalmente nossa forma de vida. Alteramos a idade reprodutiva, reduzimos o número de filhos por mulher e tivemos que passar a nos preocupar com o sustento na velhice.
Como vimos, alteramos nossa expectativa de vida ao nascer. No entanto, pouco fizemos para o prolongamento do limite da vida. Mesmo no distante século 19 tínhamos relatos de pessoas que chegavam aos 100 anos. Assim, o que mudou foi o número de pessoas que conseguem chegar aos 100 anos.
Atualmente, há muitos pesquisadores explorando possibilidades de empurrar as barreiras da vida humana para limites cada vez maiores. Durante 300 mil anos a nossa expectativa de vida girou entre 30 e 40 anos. Em apenas 200 anos dobramos nossa expectativa de vida ao nascer. Diante dos avanços científicos não seria surpreendente pensar que logo conseguiremos expandir significativamente os limites da vida. É sobre esse tema que o pesquisador Sergey Young trata no seu livro The Science and Technology of Growing Young. Segundo ele, a primeira pessoa a viver até 200 anos, já nasceu.
A despeito disso, a questão é de que forma os avanços científicos serão distribuídos para a população. Será que conseguiremos avançar rumo a uma sociedade mais justa e sustentável? Ou, será que rumaremos para uma sociedade regida por uma elite extremamente longeva ou imortal, onde grande parte dos humanos se tornem descartáveis?
Pessoalmente, gostaria de ver toda a genialidade humana voltada para melhorar a qualidade de vida em nossos limites atuais de expectativa de vida. Viver 200 anos ou se tornar imortal não é uma ideia que me atrai. Se conseguir viver os próximos 20 anos com qualidade de vida e boa saúde, já me dou por satisfeito.
Contudo, muitas pessoas pensam diferente de mim. Assim, continuaremos a avançar nos limites da vida humana. Você, querido leitor, gostaria de viver 200 anos ou se tornar imortal?