Muitos investidores acreditam que para ter sucesso precisam bater o mercado. Na verdade, para vencer no longo prazo, é preciso ter disciplina para investir sempre e capacidade de suportar as inevitáveis quedas. Embora pareça uma informação batida, de tempos em tempos é preciso falar sobre isso. Considerando o grande aumento de investidores na Bolsa de Valores, neste artigo, resolvi trazer alguns dados e uma pesquisa a fim de refletirmos sobre o poder da disciplina para quem decide investir em renda variável.
Em dezembro de 2021, o número de investidores pessoa física ativos da B3 atingiu a marca de 4,209 milhões. Mesmo considerando que a adição de 759.935 CPFs se deve aos novos investidores do Nubank, o resultado foi excepcional. Em 2021, tivemos um aumento de 55% em relação ao mesmo período de 2020, quando havia 2,715 milhões de CPFs. Só os investimentos em ETFs cresceram 232% no último ano, alcançando R$ 10 bilhões. Uma curiosidade: o primeiro artigo que publiquei na Revista RI, em maio de 2013, já defendia enfaticamente o investimento em ETF, quando o produto era quase um desconhecido no Brasil.
São números excepcionais, tendo em vista que o ano de 2021 não foi nada amigável para os investidores em ações, com a queda de quase 12% do Ibovespa. Mesmo assim, ao contrário de todos os outros períodos de baixa nas cotações das ações, neste ano, a Bolsa atraiu investidores pessoa física. Melhor ainda é que estamos conseguindo trazer os jovens para o mercado. O relatório “Uma análise da evolução dos investidores na B3”, baseado no terceiro trimestre de 2021 e publicado em novembro – portanto, anterior ao fenômeno Nubank –, traz outros dados alvissareiros. A Bolsa atrai cada vez mais jovens: 30% dos cadastrados têm entre 19 e 24 anos e 48% são adultos com 25 a 39 anos.
Quanto ao perfil desse público, é natural que boa parte dos jovens tenha uma postura mais especulativa e de curto prazo. Infelizmente existe muito material de baixa qualidade na internet incentivando uma postura mais especulativa na Bolsa. Mas os dados do crescimento do investimento em ETFs mostram que muitos estão começando da maneira correta. Talvez estejamos evoluindo em relação à educação financeira da população brasileira, área em que me orgulho de trabalhar.
Na Universidade Federal de Santa Catarina, tenho uma disciplina chamada Finanças Pessoais, que é optativa para alunos de todos os cursos. Tenho a satisfação de, a cada semestre, lecionar para cinco turmas sempre lotadas e com longa fila de espera para vagas remanescentes. Na disciplina, recomendo o investimento no mercado de ações baseado nos princípios das Finanças Modernas e da eficiência dos mercados. Segundo esses princípios, a melhor forma para investir é em uma carteira diversificada, de forma constante e durante muito tempo, principalmente com o objetivo de criar um pecúlio para a aposentadoria. Comprar e vender aos poucos, com diversificação, é a maneira mais eficaz de o investidor individual obter sucesso na Bolsa.
Nos EUA, com dados do Dow Jones, uma pessoa que tivesse comprado ações por trinta anos e, após, vendido durante vinte anos, em qualquer período da história do índice, sempre obteria um rendimento positivo e acima da inflação. Independente do período em que começasse a investir. Mas será que no Brasil, onde o mercado tem sido muito mais volátil, uma estratégia de investir aos poucos e retirar aos poucos também funcionaria? Infelizmente não temos dados para simular diversas carteiras, o que seria necessário para a análise ter significância estatística de 50 anos, como fiz com os dados dos EUA. Então, vamos à pesquisa que, desde o início dos anos 2000, atualizo e apresento aos meus alunos para demonstrar que a estratégia de compras constantes e vendas constantes funciona por aqui.
A pesquisa utiliza como matéria-prima a cotação mensal de abertura do Ibovespa em dólares entre janeiro de 1968 e dezembro de 2021. Ou seja, considerei cada um dos 648 meses compreendidos nesses 54 anos de dados. Seria como se alguém pudesse comprar e vender no primeiro dia de cada mês cotas de um ETF que tivesse um rendimento igual ao Ibovespa em dólares – para efeito didático, chamarei esse investimento de BovaDolar. A partir desses dados, simulei seis métodos de investimentos diferentes, num total de 6.700 cenários.
No lugar do termo cenário, talvez fosse melhor utilizar carteira, porém isso poderia gerar confusão com a própria simulação do Ibovespa em dólar, o BovaDolar. Então, defino como cenário o momento em que se inicia um processo de compra. O primeiro cenário de cada método sempre começa em janeiro de 1968, o segundo cenário inicia em fevereiro de 1968, e assim sucessivamente até que seja feita a última venda em dezembro de 2021.
No primeiro método, o investidor faria uma compra de 100 dólares em BovaDolar e venderia dez anos depois. Foram simulados 528 cenários, o primeiro iniciando em janeiro de 1968, o segundo em fevereiro e assim sucessivamente. Mesmo investindo em um prazo longo, em 107 períodos, ou 20,2% do total, o investidor teve retorno negativo. A taxa interna de retorno (TIR) média foi de 9,55% em dólares americanos, e o desvio padrão (risco), 9,98%.
No segundo método, foram feitas 120 compras mensais de 100 dólares em BovaDolar e uma única venda do total investido dez anos depois. Novamente foram simuladas 528 carteiras, a primeira iniciando em janeiro de 1968, a segunda em fevereiro e assim sucessivamente. Houve prejuízo em 140 cenários ou 26,5% do total. A TIR média foi de 13,48%, e o desvio padrão, 12,53%.
Com esses dois métodos, fica evidente que apenas o longo prazo não garante baixo risco para o investidor. Então, nos métodos seguintes, simulei compras mensais por um período e vendas mensais proporcionais ao tamanho da carteira durante os meses seguintes. O único que deu prejuízo foi o terceiro método, no qual simulei dez anos de compras e cinco de vendas, com um total de 468 cenários: em 63 deles, ou 13,46%, o resultado foi negativo.
A partir daí, não houve nenhum método em que o investidor tivesse prejuízos. No quarto método, simulei doze anos de compras e seis de vendas. No quinto, foram catorze anos de compras e sete de vendas. No sexto e último, foram dezesseis anos de compras e oito de vendas, com 360 cenários de investimentos diversos – a TIR média foi de 13,98% e o desvio padrão, apenas 3,31%. Nesse ponto, precisei parar, pois o tamanho da amostra tinha chegado ao seu limite de significância estatística.
Após simular 6.700 diferentes cenários, a mensagem final é cristalina: quanto maior o tempo de investimentos e desinvestimentos menor o risco e maior a expectativa de retorno. É uma estratégia segura e de baixo risco estabelecer, durante toda a vida produtiva, um programa de compras programadas de ações ou, melhor ainda, de ETFs, depois desinvestir lentamente durante a aposentadoria. Para isso, temos que pensar como Balboa: é preciso saber apanhar nos períodos de baixa das cotações.
Espero muito que os jovens investidores na Bolsa aprendam essas lições e não se machuquem no mercado.